segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Da história que não foi escrita


'Juro que não vai doer
Se um dia eu roubar
O seu anel de brilhantes
Afinal de contas dei meu coração
E você pôs na estante'

A casa vazia me fazia sentir uma espécie de nostalgia insana, de alguma forma clichê eu já me sentia ali anteriormente, embora nunca houvesse sequer passado por aquela rua.
Ele me ligara e a voz de sempre com sotaque de quem ri parecia chorar, parecia me dizer adeus, parecia me sufocar. Foi o que moveu minhas pernas.
Eu tinha dificuldade em entender, eu com os olhos sempre alertas não enxergava muito bem o que era tão explícito, foi o que ele me disse.
Impertinente, quem ele achava que era pra me dizer qualquer coisa? Era um garoto, daqueles que Leoni já cantara, daqueles que a gente conhece e reconhece em todos os outros, por ser tão parecido. Fora um grande amigo um dia.
Fazia quanto tempo? Nem me lembrava da última vez em que o abraço de menino magrelo me apertara. 
Eu acabara afastando o pequeno gesto dele, tinha vocação pra isso.
Então diante do portão entreaberto fui entrando na casa, queria um deja vù que me fizesse entrar no nosso passado de cumplicidade, de tardes inteiras conversando sobre tudo e nada, de bons dias e noites que eram mesmo excelentes.
Queria entrar no que foi lindo e talvez pudesse ser de novo e subindo as escadas terrivelmente empoeiradas eu ia tocando tudo, sujando as mãos na expectativa de limpar qualquer coisa que remetesse a um passado doce.
Lá em cima de um sobrado como aquele que a gente dizia que mobiliaria quando fôssemos adultos e nos mudássemos para a cidade grande, lá em cima havia um quarto.
E então lá estava eu em todos os lugares. Eu reclamando da mania dele de me fotografar, eu sorrindo com os olhos ainda confusos após acordar, eu chorando por ter me machucado passando por baixo de arame farpado enquanto procurávamos por um poço em algum canto daquele Planeta nosso que era tão nosso. Tão.
Eu estava nas capas de cds espalhadas, os cds que cantavam as nossas músicas. Estava no ursinho de olhar perdido pra janela, no ursinho que eu mesma dera pra ele por já estar certa de não ter mais idade pra ter ursinho em cima da cama.
Ali estava a menina cheia de sonhos, de vontades e de medo de se apaixonar. A que afastara de si o melhor amigo, que negara veementemente, que fugira como se estar com quem se ama fosse uma maneira menos digna de guerrear.
E lá estava ele, em quase todas as fotos.
Mas apenas lá.
Chamei pelo nome que sufocava, corri pela casa deserta já começando a perder a luz vinda de fora, apertei o ursinho que eu já duvidava se tinha idade pra não querer mais. E nada dele.
Foi então que eu chorei e chorei e chorei todas as lágrimas de um desamor não vivido por crença de que mudar o nome pode mudar o sentimento.
E chorei mais quando notei que ele não estava escondido em algum lugar esperando pra vir secar minhas lágrimas. E quando não consegui mais parar de chorar eu fui até o quarto, recolhi cada lembrança, cada pedaço que ele tinha espalhado e voltei para casa.
Na saída achei um bilhete dele:
'Tem amor que não sabe ficar perto de quem ele ama. Mas existe uma rosa guardada na memória, em qualquer Planeta que ele esteja'.
E cada foto, cada saudade, cada beijo que poderia ter sido dado, roubado ou negado, veio me assombrar durante aquela noite e por muitas noites depois.

(Ao som de Daniela Mercury: Mutante)

Lembrando que você ainda pode participar do Concurso de aniversário do Blog, é só clicar aqui.

Um comentário:

  1. Parabéns por ter vencido, o texto está realmente bom! Beijo grande.
    Raíssa [smileonly-now.blogspot.com]

    ResponderExcluir

Lembre-se que você me faz feliz. Críticas serão sempre aceitas, desde que você use de um mínimo de educação. Eu jamais ofendo ninguém, tente prezar a reciprocidade.
Beijos!

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...