domingo, 14 de agosto de 2011

Do jeito que se dá


'Amor é sorte'

Estava de luto porque morrer fazia parte do processo de nascer de novo, de dar espaço pro outro vir e encher de luz e cor. Porque preto não era mais a ausência de luz, como o silêncio não era ausência de som, como a solidão não era a ausência de nada. Tudo se fazia sem oposto, sem antônimo. Cansara-se de todas essas dicotomias baratas.
Fechara o livro da Clarice e dispusera-se a fechar os olhos e sair pulando, tropeços e joelhos sujos vez ou outra fortificavam os passos, não aprendera a ter firmeza nas pernas na primeira vez que se pusera de pé mesmo.
Era preciso treino pra ser gente grande e bonita, gente de olhos brilhantes mesmo com choro preso na garganta. Combinava com postura de quem queria mudar o mundo isso de trancar a alma e sofrer?
Sofrimento levava além, devia ser assim. E devia nem existir, pra começar.
Deixasse pra sofrer quando fosse requisitado mesmo.
Lá fora era agosto ainda, embora quisesse setembro.
Mas as coisas não eram sempre como se queriam, seguiam lá o ritmo delas, mais lento ou mais rápido, dependia da sensibilidade de quem as sentia.
Que fosse à gosto então, ao dela.
Enchesse tudo de Sol e inverno, uma combinação boa pra se jogar na calçada e brincar de ver a vida passar pingada mesmo, tempo é artigo sem domínio, meio vento.
Se chovesse que inundasse e disfarçasse uma ou outra lágrima besta. E que o sorriso não fosse monalisado, que significasse sempre sorriso mesmo, sem análise, sem besteira e sem medo da fugacidade das coisas boas.
O que é bom dura, perdura, vira história contada pra filhos de como algumas coisas tinham um sabor bom meio parecido com picolé de maracujá.
O que é bom está na gente, dentro.
Tudo mais é sorte, pra quem acredita.
Ou não.

(Ao som de Rita Lee: Amor e Sexo)

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