"Querido,
Você provavelmente está rindo o seu sorriso mais doce ao ver o meu embrulho chegar, em algum lugar aí dentro você deve ter previsto que cedo ou tarde eu enviaria meu coração dentro de uma caixa, já que a chave você julgou sempre pertencer.
Por dias eu quis arrancar o peito e te enviar sim, depois veio a raiva e tivesse eu contatos terroristas um pó estranho chegaria pelo correio.
Mas passou o temporal e veio o vento com seu cheiro sabe? Maldito perfume esse seu que não há banho que afaste.
Então por favor, para começar, desfaça o sorriso, não te mando boas novas, sinto muito. Não são boas e nem novas, são apenas notícias de uma vida que vai seguindo em frente. Aqui e ali tropeço com suas roupas jogadas no sofá, sua toalha sobre a cama e a sua mania de apertar a pasta de dente no meio. Eu te persigo na memória e te expulso na vida real, coisa insana.
É que não dá pra te querer pra sempre, não com você aí, sem saber ao certo o que fazer. Não dá pra deixar a janela aberta todas as noites esperando e confiando que uma hora você vai se tocar da minha ausência, se tocar da sua ausência e me trazer de volta o que me falta. Maio vem aí amor e está esfriando aqui, preciso fechar as portas que te esperam.
Foi sua opção, não a minha, mas que bem que lhe quero aqui dentro!
Sabe aquela coisinha da gente passar a tarde de mãos dadas olhando para as árvores balançando suas folhas e dizendo que com a gente ia ser tudo diferente, é.
É diferente porque as pessoas dizem que a gente acabou, mas eu me lembro de você me deixar sorrindo com um beijo na testa e ir-se indo. Gerúndio não aceita ponto final, é contínuo e a gente ainda vai construir alguma coisa, sei que vai.
E mando então madeira.
Sou uma tolinha amor, mas eu sei que não há calor aí também. Sei que o frio que faz nos meus pés não são suas meias que vão alterar.
Mando matéria-prima da fogueira que preciso que te aqueça, imagine que fui até a árvore que era nossa paisagem distante e pedi permissão para arrancar alguns galhos. Expliquei que era causa justíssima amor. Ela deixou.
Lembrei você lendo Clarice e me dizendo que me amava do seu jeito de apanhar gravetos.
Pega a caixa e sente, tem fogo morto esperando nascer aí. Faz favor de ligar.
Faz favor de colocar aí no seu peito murcho que você está tentando fingir de cheio, deixa aquecer e colorir seu rosto, deixa avivar os olhos e quando estiver queimando tudo, vem pra mim.
Imagine a confusão pra eu me convencer que não enlouquecera de vez ao te enviar pedacinhos de pau, insistia que era o jeito, não há que se fazer quando o outro insiste em comer terra pra esquecer que já foi mais que um.
Agora amor, aquele sorriso do início, quando você colocou os ouvidos no embrulho e tentou ouvir um turu-turo desafinado, volte com ele.
Razão não queria lhe dar, mas é sua a chave.
E é seu o fogo.
Junte tudo com carinho e me traga uma fogueira linda.
Faz favor amor de vir logo que o fogo é grande e pode queimar tudo se você não dividir.
Tenha medo não que está escuro, mas a claridade vem contigo, e se a janela estiver fechada incendeie que acordar em meio ao fogo nosso vai ser no mínimo maravilhoso.
Com carinho de um coração teimoso,
Beijo,
Tay.
(Texto escrito para a edição cartas do Projeto Bloínquês)