sexta-feira, 6 de abril de 2012

Da única certeza da vida



I was just guessing at numbers and figures
Pulling the puzzles apart
Questions of science, science and progress
Don't speak as loud as my heart
And tell me you love me, Come back and haunt me
Oh when I rush to the start



Último parágrafo.
Ponto final. Sem sinal de reticências alguém se aproxima e toca a mão gelada, apática. Houvera vida ali, não há mais. 
O ofício termina. Só o dia parece não ter fim. Faz calor, você está morta e faz calor. É setembro, as flores estão começando a aparecer, o céu tem aquele tom de azul que você gosta tanto e que sonhava que teria o quarto dos nossos filhos. 
É setembro e você está morta. 
As flores estão ao seu lado, há flores em tantos lugares e eu só queria que você estivesse aqui e risse do quão ridículo parece a vida agora.
Alguém se aproxima e pergunta a mesma coisa, outra vez, toda hora. Eu não quero café, não quero descansar, não quero um abraço, não quero saber o que aconteceu com o dono do carro, não quero ter que recuperar os pedaços da bicicleta dela, não quero beber...  Eu não sei mais beber porque você pedia que eu fosse uma boa pessoa e eu adorava o modo como você sorria, como você sorria e jogava um pouco o pescoço para trás e franzia às vezes ruguinhas que nasciam no meio das duas sobrancelhas.
Meus olhos não aguenta mais, meus braços pesam, preciso de um café, mas andar significa mais pessoas. Mais abraços. Mais pêsames. E já pesa o mundo, será que você entende?
Queria jogar fora tudo que havia dento porque talvez a dor vá embora assim. Quero esmagar a cabeça porque não faz mais sentido, nada mais faz sentido. Tantos cálculos, tantos planos, tantos sonhos, tanta vida e nada mais tinha sentido. De repente eu não queria mais nada, não sei mais nada, não espero mais nada. 
Você morreu e de repente a sensação que eu tenho é que agora, agora com lágrimas entupindo tudo e mesmo assim não rolando, agora eu não tenho mais nada.
Alguém chama meu nome e eu sei que preciso me despedir, mas não quero. Você foi embora. Crueldade sem fim.
Você foi embora e não haverá mais o Sol batendo no seu rosto de propósito porque eu deixei a cortina aberta só para ver bobo o modo como seu cabelo brilha de manhã. Você foi embora e nunca mais o chuveiro vai gotejar por horas porque você não fechou direito. 
Você foi embora, mas eu nunca disse adeus.
Seria ridículo se todos percebessem que eu te amo bem mais do que sempre suportei pensar amar alguém? Seria absurdo se todo mundo entendesse finalmente que a vida vai continuar, mas parou aqui porque cadê você, cadê você reclamando que veio de salto mas pedindo para poder ir embora descalça? Cadê você porque eu preciso dizer que eu te amo o mundo inteiro. Eu te amo bem mais do que eu disse ontem quando você estava se despedindo para trabalhar, eu te amo bem mais do que eu disse todos esses anos, eu te amo e não quero que você vá. Por favor, acorde.
Todos esperam que eu diga alguma coisa, mas eu não posso tentar, você entende? Sei que você riria se eu dissesse alguma coisa errada e o fantasma do som do seu sorriso faz com que eu tenha novamente aquela vontade de jogar tudo ao chão e dizer coisas cruéis.
Apenas posso olhar para você. Como acreditar que será a última vez? Não dá para decorar tudo.
Último parágrafo, alguém se aproxima para cobrir de madeira seu rosto, não posso olhar, não posso impedir, não posso gritar com todos e mandar para lugares inabitados. Não posso roubar você para mim. Alguém pergunta sobre a fachada que você estava concluindo, espera que eu tenha respostas. Eu apenas te olho e você não está mais aqui. Talvez eu nunca mais tenha resposta para nada. Talvez agora eu feche o livro, não importa se a minha história ainda está no meio, a sua acabou.


(Ao som de The Scientist - Coldplay e Eu Nunca Disse Adeus - Capital Inicial)

2 comentários:

  1. . Talvez eu nunca mais tenha resposta para nada. Talvez agora eu feche o livro, não importa se a minha história ainda está no meio, a sua acabou. . lindo muito lindo

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  2. Moça! Muito lindo. Hoje perdi um amigo e chorei pra caramba agora. Parabéns!
    Obs.: Quando eu crescer quero escrever bonito como você *---* Se cuida.

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Lembre-se que você me faz feliz. Críticas serão sempre aceitas, desde que você use de um mínimo de educação. Eu jamais ofendo ninguém, tente prezar a reciprocidade.
Beijos!

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