'Eu sei que é pra sempre
Enquanto durar
Eu peço somente
O que eu puder dar'
Desde sempre ela estava acostumada com aquela paisagem, vez ou outra o riacho mais cheio das águas do verão, ou das lágrimas da sua infância e adolescência.
Tinha escolhido a ponte como o seu lugar no mundo, o avô a levara ali uma vez para pescarem e não tivesse sido a pescaria um grande fracasso, talvez ela nunca mais voltasse a se recostar na madeira cada dia mais envelhecida e desbotada pelo tempo.
Não era mais uma menina, a fazenda dos avós fora vendida, o destino das férias mudara de lugar, os pais não tinham mais paciência para aprender lições com riachos e o coração já havia se quebrado tantas vezes e se refeito que quase com vinte ela não sabia direito quando tinha deixado de ser aquela menina de cabelos encaracolados e castanhos.
O reflexo na água era outro agora.
Tocando o beiral ela se ajoelhou diante do nome do primeiro amor e com tinta negra o cobriu, fora uma linda história, mas não merecia mais estar estampada na sua paisagem preferida.
Sentou-se e puxando a nostalgia trouxe a memória as milhares de vezes que esteve ali, cada sorriso bobo apaixonado e cada lágrima de paixão ou desamor.
E por sorte ou destino o riacho enfim lhe ensinou a maior lição de todas, não há que se fazer na vida além de amar.
O rio segue seu caminho que não sendo fácil, o fortalece, enfrenta secas e tempestades, pedras e curvas, mas chega ao mar.
Não fora o primeiro, nem o segundo, mas seria algum, podia apostar que sim, talvez fosse aquele que se dispusera a viajar distâncias e a invadir uma propriedade alheia para procurar uma ponte velha.
Respirou fundo e decidiu que tentaria quantas vezes fosse preciso, por aquele riacho que se mantivera vivo dentro dela.
Ele tocou a ponta dos cabelo dela, fez o caminho do ombro e sussurrou não como quem cobra, mas como quem tem todo o tempo do mundo para esperar:
- Podemos passar a noite aqui se você quiser...
Ela não respondeu, rabiscou com a unha descascando na madeira um novo nome e se permitiu ficar jogada nos braços dele, cumprindo seu destino sem pressa de chegar ao oceano.
(Ao som de: Titãs - Porque eu sei que é Amor)
Texto para a 53ª edição visual do BLQ.
Texto para a 53ª edição visual do BLQ.